Bastidores
De Aguinaldo Silva, Império tinha referências em outro trabalho do autor: Suave Veneno (1999). A base para as duas novelas foi “Rei Lear”, de Shakespeare.
A direção de núcleo era de Rogério Gomes, o Papinha, responsável por imprimir uma estética mais sóbria à obra de Aguinaldo Silva, que andava um tanto quanto carnavalesca quando Wolf Maya era o seu diretor, nos trabalhos anteriores (Senhora do Destino, Duas Caras, Cinquentinha, Lara com Z e Fina Estampa, de 2004 a 2012). Papinha foi ainda o diretor artístico de O Sétimo Guardião (2018-2019), de Aguinaldo.
O autor montou sua trama de altos e baixos repleta de apelos que despertaram curiosidade no público. Personagens complexos, bem dirigidos e bem interpretados (a maioria), com histórias que tinham tudo para render ótimos entrechos, enlaces e ganchos. Alguns conseguiram. Outros ficaram na promessa ou decepcionaram.
Alexandre Nero, estreando como protagonista, viveu o Comendador José Alfredo de Medeiros, em uma brilhante caracterização, papel que marcou sua carreira. Um anti-herói, amado e odiado, o Comendador foi um personagem cheio de nuances, qualidades e defeitos. Tampouco foi uma unanimidade para o público, que farejou pedofilia por causa do envolvimento amoroso do personagem com a ninfeta Maria Ísis, vivida por Marina Ruy Barbosa, jovenzinha cafetinada pelos próprios pais (personagens de Zezé Polessa e Tato Gabus Mendes).
Alexandre Nero ficou sabendo que viveria o papel primeiro pela mídia. Aguinaldo Silva, antes mesmo de convidá-lo para a novela, afirmou para a imprensa que o queria em Império.
“Isso não vai dar certo!”, pensou Nero quando recebeu a proposta de viver o protagonista. “Porque era um cara mais velho do que eu”, afirmou em entrevista em abril de 2021, por ocasião da reprise da novela.
Alexandre Nero tinha 44 anos na época, ainda não era pai, e achava engraçado ser pai na ficção de Andreia Horta, treze anos mais nova do que ele, e de Caio Blat, dez anos mais novo. Uma das inspirações para o ator interpretar o personagem foi seu próprio pai: “Inclusive as maneiras grosseiras e afetivas.”
Como apoio ao personagem de Nero, outra boa interpretação: Lília Cabral, como a arrogante e espirituosa Maria Marta, a ex-mulher do Comendador.
Além de Alexandre Nero e Lília Cabral, merecem destaque os esforços de Leandra Leal, Drica Moraes, Marjorie Estiano, José Mayer, Suzy Rêgo, Zezé Polessa, Tato Gabus Mendes, Caio Blat, Othon Bastos e Dani Barros.
Paulo Betti, Paulo Vilhena e Aílton Graça dividiram opiniões. Muitos torceram o nariz para o histrionismo de Betti, como o jornalista fofoqueiro Téo Pereira; para os exageros do pintor maluquinho Salvador (de Vilhena); e para a interpretação de Aílton Graça, como a cross-dresser Xana.
Aguinaldo Silva criou o personagem Téo Pereira para José Wilker interpretar. Porém, lamentavelmente, o ator faleceu, vítima de um infarto fulminante, em 05/04/2014, quando a novela estava em pré-produção.
Em abril de 2021, em entrevista para a divulgação da reprise da novela, Paulo Betti revelou que sofreu com as críticas (e com a “nota zero”) ao exagero e ao tom estereotipado de Téo Pereira.
O ator afirmou que para compor Téo Pereira inspirou-se nos jornalistas Léo Dias e Leão Lobo e no personagem homossexual de Sérgio Mamberti no filme O Bandido da Luz Vermelha (1968), de Rogério Sganzerla. Ficou famoso o bordão do personagem, “Curuzes!”, dito com uma careta de espanto ou de ironia, como uma exclamação de surpresa ou reprovação.
As primeiras chamadas da novela vendiam Cora, a personagem de Drica Moraes, como a grande vilã de Império. A expectativa também foi grande. Porém, infelizmente, Cora ficou na promessa e acabou se transformando em uma vilã cômica, “pé-de-chinelo”, com direito a flatulência e fungada em cuecas de marmanjos.
Para piorar a situação, Drica Moraes foi afastada da novela (no fim de novembro de 2014), por motivos de doença. Em seu lugar, o autor preferiu trazer de volta Marjorie Estiano, que vivera a personagem na primeira fase da trama, quando Cora era jovem. Aguinaldo Silva mandou a lógica para os ares e não apresentou nenhuma explicação plausível para o repentino rejuvenescimento de Cora – um verdadeiro golpe de realismo fantástico dentro da proposta realista de Império.
Marjorie Estiano, por sua vez, apresentou uma Cora mais visceral, que, talvez, tivesse rendido bem mais se a atriz tivesse permanecido como a intérprete da personagem desde o início.
Além de Maria Marta (Lília Cabral), outros personagens tiveram seguimentos que os distanciaram de suas personalidades iniciais. Ou cujos desfechos resultaram pouco coerentes com suas trajetórias.
Téo Pereira (Paulo Betti), o jornalista fofoqueiro e viperino na maior parte da trama, fez seu mea-culpa e se transformou em um “jornalista de respeito”.
Enrico (Joaquim Lopez), o odioso homofóbico, passou a amar e a aceitar o pai gay, Cláudio (José Mayer), depois que este quase morreu – tudo muito repentinamente.
Cláudio e Leonardo (Klebber Toledo) reataram no final – um desfecho forçado e incoerente para a história que eles haviam vivido.
Orville (Paulo Rocha), de escroque mau-caráter, regenerou-se e passou a ajudar o pintor que ludibriava, Salvador (Paulo Vilhena).
O casal de pilantras Magnólia e Severo (Zezé Polessa e Tato Gabus Mendes) se redimiram depois de tantos golpes: na última semana, Magnólia revelou-se uma mulher até sábia, enquanto Severo descobriu-se, de uma hora para outra, com Alzheimer.
Xana (Aílton Graça), que suspirava por rapazes no início, lutou pela guarda de uma criança e, por fim, aceitou viver de boa com um casal.
O mordomo Silviano (Othon Bastos), de discreto e servil, revelou-se o grande vilão da história, ensandecido em uma trama de vingança pessoal contra o Comendador que envolvia o próprio filho dele, José Pedro (Caio Blat) – a revelação de que José Pedro era o misterioso Fabrício Melgaço acabou por deixar pontas soltas e mal explicadas na trama e um desfecho bastante questionável.
Além de locações em Petrópolis (no Rio de Janeiro), em Genebra (na Suíça) e Annecy (na França), a equipe de produção e alguns atores do elenco gravaram as primeiras cenas no município de Carrancas, no interior de Minas Gerais, que representava na história o Monte Roraima. Explicou o diretor Pedro Vasconcelos:
“Carrancas, na verdade, tinha um lugar que se assemelhava muito ao Monte Roraima. É o lugar mais alto da serra, é uma floresta de pedra que nos remetia muito ao Monte. Se nós tivéssemos que ficar no Monte Roraima mesmo, seria sol e chuva o tempo todo, sem proteção e defesa. E em Carrancas os lugares conseguem nos dar estrutura para podermos trabalhar.”
Ao todo foram três semanas de gravação, com a participação de 130 profissionais, em lugares como a Chapada do Abanador, Gruta da Ponte e Cachoeira do Turco.
Primeira novela do ator Júlio Machado e da atriz Viviane Araújo e a estreia de Chay Suede na Globo.
No capítulo exibido em 06/03/2015 (em que o Comendador recupera sua fortuna e nada em uma piscina cheia de euros), o tema musical da abertura apresentada naquela noite foi “Pedras que Cantam” (com Fagner), o mesmo tema de abertura de outra novela de Aguinaldo Silva, Pedra Sobre Pedra (de 1992) – que, inclusive, era reprisada na ocasião pelo canal Viva.
Império foi a vencedora do Emmy Internacional (prêmio norte-americano) de melhor novela de 2014.
Também foi premiada com o Troféu Imprensa de melhor novela, melhor ator (Alexandre Nero) e melhor atriz (Lília Cabral).
O título provisório da novela era Falso Brilhante.
Outra novela que teve “Rei Lear”, de Shakespeare, como inspiração foi Roda de Fogo, produção da TV Tupi, de 1978, escrita por Sérgio Jockyman e Walther Negrão.
Em março de 2020, em virtude da pandemia de Covid-19, as emissoras de TV suspenderam temporariamente suas produções de dramaturgia, interrompendo a exibição de novelas e substituindo-as por reprises ou outros programas. Assim, Império foi reprisada entre 12/04 e 06/11/2021, como tapa-buraco, para preencher a paralisação momentânea das gravações e exibição de novelas inéditas por tempo indeterminado até a situação se normalizar.
A reapresentação gerou um subtítulo à novela, “Edição Especial”, destacado no logotipo.
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