Bastidores:
A novelista Elizabeth Jhin, conhecida pelas abordagens espiritualistas em sua obra (Escrito nas Estrelas, Amor Eterno Amor, Além do Tempo), trouxe novamente uma trama envolvendo a crença em vidas passadas, desta vez com boa dose de fantasia – como o espelho que servia de portal do tempo e que levou a protagonista Cris Valência (Vitória Strada) a reviver uma vida passada.
Em sua última novela, Além do Tempo, as histórias aconteciam em duas fases, com os mesmos personagens em encarnações diferentes, primeiro no passado e depois na atualidade. Espelho da Vida apresentou uma história de amor e mistério que ultrapassava as barreiras do tempo e do espaço ao se desenrolar em duas épocas distintas concomitantemente. Elizabeth Jhin explicou, na época do lançamento da novela:
“As tramas de 2018 e de 1930 se desenrolam ao mesmo tempo devido às ‘viagens no tempo’ que a nossa personagem, Cris Valência, empreende. Assim, o espectador consegue acompanhar a vida dela e de outros personagens na atualidade, e também o que ela descobre e enfrenta em sua outra vida. Cada vez que ela faz a ‘passagem’ pelo portal do espelho, ela nos leva a outra realidade. (…) O espelho tem uma grande importância na história, ele é o portal por onde Cris Valência chega a outras dimensões.”
Pedro Vasconcelos, em sua estreia como diretor artístico, comentou sobre Espelho da Vida:
“É uma novela atual e de época. Ao mesmo tempo. É um desafio muito grande criar esses universos distintos e em paralelo. É uma trama com três camadas: época, atualidade e o filme, algo que eu ainda não tinha vivido. (…) Acho que, para o telespectador, será muito curioso. Ele assistirá às cenas atuais ao mesmo tempo em que acompanhará as cenas de época. Vai entender a mudança de décadas pelo figurino, paisagens, objetos etc.”
Referências em outras novelas
A trama da novela lembrava a de outra obra, Anjo de Mim (1996-1997), de Walther Negrão, na qual Jhin foi colaboradora. Nesta, o personagem de Tony Ramos se recordava de uma vida passada, em que presenciou um crime passional. Ele tenta encontrar a reencarnação da amada do passado enquanto elucida o crime. Em Espelho da Vida, a protagonista também investiga um crime passional envolvendo uma encarnação passada. Porém, uma novela nada tem a ver com a outra, trata-se apenas de variações de uma mesma temática.
Quanto à narrativa, a semelhança era com a novela O Casarão, que Lauro César Muniz escreveu em 1976, na qual três épocas diferentes aconteciam simultaneamente para o telespectador. No entanto, por ser uma narrativa pouco visitada em teledramaturgia, essa simultaneidade em vidas diferentes conferia a Espelho da Vida um sabor da novidade.
Também havia os bastidores de um filme que era rodado na cidadezinha fictícia, sobre uma história real que aconteceu no local, no passado – referência à novela Roque Santeiro (1985-1986), de Dias Gomes, com lampejos à metalinguagem da novela Espelho Mágico (1977), de Lauro César Muniz.
Ibope baixo
Espelho da Vida passou por mais de sua metade cambaleando na audiência, abaixo da meta esperada para o horário. Terminou com uma média final de 17,5 pontos no Ibope da Grande São Paulo, a menor desde 2015.
A novela também enfrentou a concorrência, no caso, o bom desempenho na audiência do jornalístico Cidade Alerta, da Record TV, que, geralmente, se mantinha 3 e 4 pontos atrás no Ibope da Grande São Paulo. Em 22/11/2018, Espelho da Vida perdeu pela primeira vez para a concorrência, na média do dia: 15 pontos no Ibope ante 17,3 do jornalístico da Record, sendo que a novela não chegou a liderar em nenhum minuto durante todo o capítulo – o que jamais havia acontecido na história do horário na Globo. No dia seguinte, a novela perdeu novamente, marcando 13 pontos contra 14 da concorrente. O auge aconteceu no final de janeiro, com a tragédia do rompimento da barragem de Brumadinho (MG), que teve cobertura do Cidade Alerta. Depois desta “baixa” em janeiro de 2019, a novela começou a reagir em fevereiro, para só ultrapassar os 20 pontos em suas últimas semanas de exibição.
Durante os três primeiros meses, a trama se arrastou, pouco atrativa. Pegou a baixa audiência da TV em geral no fim de 2018 e só começou a esboçar alguma reação em 2019, no momento em que a autora passou a priorizar a história no passado. Foi quando a trama de Espelho da Vida ganhou estofo, sustância e emoção genuína. Faltaram nos primeiros meses o apelo e o calor que a trama só começou a demonstrar quando a história na década de 1930 passou a ocupar maior tempo na narrativa.
Saldo positivo
No início da novela, o público foi ludibriado com um mocinho que não era mocinho: Alain (João Vicente de Castro). Mal-humorado, egoísta e até grosseiro, Alain custou a cair nas graças da audiência. Ele não era exatamente “o vilão”, tampouco um “anti-herói”, mas simplesmente um tipo intragável, que afugentava as pessoas, inclusive o público. Alain só começou a perder ares de vilão quando descobriu que Priscila (Clara Galinari) era sua filha.
Em consequência, a heroína Cris (Vitória Strada) ficou sozinha neste tempo, sem a figura do “mocinho”. Este, Danilo (Rafael Cardoso), só foi aparecer muito tempo depois, na década de 1930, e em doses homeopáticas. Enquanto isso, o núcleo do cinema se estendia com personagens aleatórios – um núcleo que em nada contribuiu para a novela, nem mesmo para a metalinguagem com proposta de “história dentro da história”.
Mesmo com todos os percalços, o saldo foi positivo. Espelho da Vida teria sido uma novela “redonda” se mais enxuta.
Elenco
O elenco era ótimo, bem apoiado na direção e no texto, com alguns atores vivendo papeis duplos, com destaque para Vitória Strada, Alinne Moraes, Irene Ravache, Felipe Camargo, Júlia Lemmertz, Suzana Faini, Patrícya Travassos, Ana Lúcia Torre e Emiliano Queiroz.
Um grande momento para Felipe Camargo, como o malandro simpático Américo, na vida presente, e o terrível vilão Coronel Eugênio Castelo, na vida passada.
Produção
A produção era de primeira, com apuro técnico, iluminação envolvente, arte, figurinos e cenários caprichados e trilha sonora de bom gosto. Uma novela bonita e agradável de assistir.
As gravações da novela começaram em locações externas em Minas Gerais. A equipe passou por Carrancas, Mariana, Tiradentes e Ouro Preto. A Praça Gomes Freire, mais conhecida como Jardim, foi a principal locação usada em Mariana. Lá estavam os casarões que representavam na trama a residência de Vicente e Margot (Reginaldo Faria e Irene Ravache), a livraria Cavaco e a Pensão Rosa Branca.
“Tenho uma grande preocupação com o realismo, por isso vamos gravar bastante no centro histórico de Mariana, que funcionará como a ‘cidade cenográfica’ da novela. Devemos voltar a Mariana e Tiradentes com frequência durante todo o projeto”, afirmou o diretor Pedro Vasconcelos na época do lançamento da novela.
As ruas de pedras tão características de Tiradentes completaram o centro histórico da cidade fictícia de Rosa Branca. A equipe gravou cenas nas ruas próximas às igrejas do lugar, como a Matriz de Santo Antônio e a Capela Nossa Senhora das Mercês. As locações de Ouro Preto representaram na trama os locais mais movimentados Rosa Branca. E em Carrancas, a equipe aproveitou as belezas naturais da cidade, rodando cenas nas serras e cachoeiras que, na trama, eram os arredores de Rosa Branca.
A figurinista Júlia Ayres comentou sobre os figurinos totalmente distintos e que contavam a mesma história. “Foi importante criar três estéticas diferentes para que o espectador identifique imediatamente onde os personagens estão: atualidade, época ou filme”, contou.
Houve ainda uma diferenciação entre os personagens que eram do Rio de Janeiro, principalmente a trupe do cinema, e os moradores de Rosa Branca. “O pessoal do filme tem mais preto na paleta e peças mais geométricas, estampas mais gráficas. E no interior é mais romântico, estampas liberty, por exemplo. A diferenciação quando eles chegam na cidade do interior precisava ser óbvia já no figurino”, revelou Júlia.
Claudiney Barino e Cristiane Lobato, cenógrafos responsáveis, tinham como missão criar um dos principais e mais emblemáticos cenários da novela: o casarão de Júlia Castelo (Vitória Strada), uma construção com duas fachadas espelhadas e opostas com ligação interna. Assim como acontecia com Cris Valência na trama, era possível entrar no casarão em 2018 e sair na década de 1930. De um lado, a edificação em ruínas: uma casa castigada pelo abandono e pelo tempo, assim como sua vizinhança. Porém, do outro lado tudo era diferente: casa em estilo neoclássico, nova, impecável, e com vida no entorno.
Como a novela mostrava a realização de um longa-metragem, a ideia era que o público percebesse detalhes das filmagens.
“Como teremos os bastidores de um filme dentro da novela, então é importante que o espectador perceba quando se trata da época e quando estamos falando das gravações do filme”, contou Rita Vinagre, responsável pela produção de arte.
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