HISTÓRIAS DE MIRACEMA...
O TOREIRO - POR JOSÉ ERASMO TOSTES
Hoje, três de maio do ano de dois mil, dia em que nossa cidade comemora sessenta e quatro anos de emancipação política de nosso município (pertencíamos a Santo Antônio de Pádua), muitos miracemenses naquela época, inconformados com a situação, desde 1920 vinham aglutinando forças para que se fizesse a separação. Várias comissões, por diversas vezes, foram ao Palácio do Ingá, para convencer o governador quanto à vontade do povo miracemense de sair do domínio de Pádua. Fora criado um jornal, o Libertas, tendo como fundador e redator Melchíades Cardoso para fazer a campanha separatista, entre os quais se destacaram o próprio Melchíades Cardoso, Dirceu Cardoso (seu filho), José Naegle e Bruno de Martino, que foram cognominados “Os quatro diabos”, inspiração provinda de um filme que passava na ocasião no Cinema 15 de Novembro. E assim, em três de maio de 1936, conseguimos a nossa emancipação. O Cônego e orador Thomaz de Aquino foi um dos que faziam parte da comissão dos separatistas e, com a palavra, mostrou ao governador Ary Parreiras a necessidade da separação.
No ano de 1946, foi rezada uma missa pelo padre Joaquim Thaumaturgo, que tive a oportunidade de assistir, pelos dez anos de separação. Mas vamos deixar de lado este assunto para os historiadores.
O leitor talvez possa pensar que vou escrever sobre uma praça de touros, ou falar sobre touros. Mas o toreiro a que me refiro, era uma caminhão que pertencia a Serraria do Melchíades Cardoso, um caminhão Ford 1946, sem cabina, sem carroceria, que mais parecia um gafanhoto. Tinha apenas o caput para tapar o motor, e fueiros de ferro de cada lado para segurar as toras. E vendo hoje essas carretas que passam por nossa cidade, com seis eixos e dezoito pneus, fico admirado como aquele caminhão, com apenas dois ou três homens, podia encarretar seis ou oito toras de vários tamanhos e de várias grossuras, em estradas de difícil acesso, com sol ou chuva.
Lembro-me dos motoristas Waldir Arruda, José Gurgel e, morrendo numa dessas viagens, Dom Carlos, que fora esmagado por uma tora que deslizara.
A serraria foi fundada por Américo Homem e depois comprada por Melchíades Cardoso, que foi adquirindo novos maquinários e ampliando o seu tamanho e o número de operários. A serraria ficava localizada onde hoje funciona o Clube 15. As toras eram depositadas na parte de traz, na antiga estrada que ia para Paraíso do Tobias, chamada de Morro da Poeira.
Das dezenas de operários da serraria, podemos destacar o Manoel Rogério, José Reis (tinha um preto e um branco), Deoclécio, Tião Baiano, Joca, Damas e Juquita. Só do Clube de Futebol Esportivo haviam oito empregados. O Melchíades era “Esportivo”.
O Melchíades fabricava ali todos os tipos de móveis. Os tacos da marca Petrônio eram vendidos para vários estados, os móveis que hoje ornamentam as dependências da Câmara Municipal foram fabricados por ele, assim como os bancos da Igreja Matriz, que foram doados pelo próprio, apesar de agnóstico ou ateu, como diziam.
Melchíades dirigiu a serraria por muitos anos, até avançada idade. Negociando-a, passou a fazer o que mais gostava: dedicou-se ao jornalismo e à política. Era poeta e foi autor do hino “Miracema Cidade”, até hoje muito executado pela Banda Sete de Setembro. Foi um emancipador de nossa cidade, prefeito e deputado. O Centro Cultural hoje leva o seu nome como homenagem.
Melchíades costumava nos meses de dezembro, não cobrar o aluguel dos seus inquilinos. Certa vez, perguntei-lhe o que fazer para viver tanto, e ele me respondeu: “Comer pouco”.
Após a venda, a serraria funcionou por poucos anos, sendo que seus maquinários foram vendidos, e assim se foi mais uma indústria de Miracema.
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